Ser mãe, para algumas mulheres, é uma grande realização. No entanto, muitas sentem uma pressão significativa imposta pela sociedade; as pessoas esperam da genitora sacrifícios e que esta exerça a maternidade acima de qualquer coisa. Sufocada, a mulher pode desenvolver alguma enfermidades durante a gestação e até mesmo depressão.
Sangramentos, dores, alteração de sono, entre outras coisas, podem acontecer e muitas mulheres não sabem como reagir a isso. Em entrevista ao LeiaJá, o psiquiatra e professor da Universidade Federal de Pernambuco Amaury Cantilino afirma que, durante a gravidez, a mulher fica com uma hipersensibilidade emocional. Ou seja, tudo passa a repercutir muito efetivamente na vida dessas gestantes.
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“Neste momento, os sentimentos estarão à flor da pele, com bastante intensidade. Diante dessa situação de vulnerabilidade emocional tão grande, quando acontece algum fato muito impactante como o não apoio do parceiro e da família, por exemplo, tudo isso é sentido com muita força e essa percepção da falta de suporte é que pode, sim, desencadear uma depressão durante a gravidez”, pontua Amaury.
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Pesquisas científicas mostram que a fase de maior frequência de transtornos mentais na mulher grávida acontece principalmente no primeiro e no terceiro mês gestacional e, também, nos primeiros 30 dias do pós-parto.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a depressão é a principal causa de problemas de saúde e incapacidade em todo o mundo. As últimas estimativas da OMS mostram que 300 milhões de pessoas vivem com depressão no mundo, um aumento de mais de 18% entre 2005 e 2015. No entanto, esses dados do último levantamento não trazem um recorte das mulheres grávidas acometidas pela depressão.
O psiquiatra chama a atenção para as alterações hormonais que as mulheres sofrem durante a gestação. Nesse período, há um aumento significativo dos níveis de estrogênio, responsável por conferir as características femininas das mulheres como tamanho dos seios, textura e brilho da pele, além de ser o responsável pelo controle da ovulação e preparo do útero para a reprodução.
Para se ter uma idéia, ao final da gravidez, as mulheres atingem níveis centenas de vezes maiores do que antes da gestação. “Mas eles caem abruptamente também nas primeiras 48 horas do pós parto. As mulheres têm receptores de estrogênio no cérebro, nos neurônios que fazem a regulação da serotonina, (que é encarregado por conduzir os impulsos nervosos), além do Gaba, (conhecido como o neurotransmissor da calma e do relaxamento)”, Detalha Amaury.
O professor explica que, tanto a Serotonina, quanto o Gaba são dois neurotransmissores diretamente implicados na regulação emocional e regulação da ansiedade. “É por isso que em algumas mulheres que, também são mais vulneráveis biologicamente, você junta esses fatores socioambientais, o estresse, podendo ter uma combinação de fatores que podem desembocar em quadros depressivos, ou transtornos ansiosos durante a gravidez e no pós-parto”, aponta o profissional.
As pessoas que estão ao redor da gestante precisam ficarem atentas ao primeiros sinais depressivos / Imagem Pixabay
Durante a gravidez tem um agravante: “Boa parte das grávidas acaba se sentindo culpada por estar deprimida no período gestacional, porque parte das mulheres gostariam de estar grávida”, confirma Amaury. O psiquiatra relata que muitas gestantes temem serem consideradas mães inadequadas, desnaturadas e, por isso, algumas que sofrem depressão na gravidez escondem dos familiares, do parceiro e dos amigos; tudo por medo de serem julgadas.
O Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro mostra que a prevalência de depressão gestacional é de aproximadamente 15% entre países desenvolvidos e cerca de 22% em países em desenvolvimento. A depressão é associada a fatores como história prévia de transtorno psiquiátrico, características sociodemográficas (baixa renda), estado civil, gravidez não planejada, complicações obstétricas, tabagismo, alcoolismo, eventos estressantes como furto e roubo, por exemplo, e ausência de apoio social, sendo esse último ponto um dos mais cruciais para muitas gestantes.
“O apoio é importante em todas as fases da mulher grávida porque, se ela estiver passando por um quadro depressivo, até para conseguir buscar ajuda ela tem que ter um suporte da família ou do parceiro que devem estimular, se confirmado a depressão, o tratamento”, destaca Amaury Cantilino.
Vale acentuar que a depressão durante a gravidez não só provoca um grande sofrimento para a mulher, como também ao bebê que pode ter essa repercussão para o resto da vida, como diz o psiquiatra. “Já existem estudos mostrando que filhos de mães que tiveram depressão durante a gravidez, têm mais dificuldades afetivas e cognitivas durante toda a vida”.
As grávidas depressivas neste estudo deram à luz dias antes das mães que não estavam acometidas pela doença / Imagem Pixabay
Um estudo realizado com 106 mulheres pelo King's College London aponta que os bebês nascidos de mães que estavam deprimidas durante a gravidez apresentaram comportamento alterado logo após o nascimento, em comparação com as mães saudáveis. Os pesquisadores descobriram que essas mudanças comportamentais e biológicas estão ligadas à inflamação induzida pela depressão e sugerem que isso pode ser um fator pelo qual crianças nascidas de mães com depressão têm um risco maior de depressão quando adultas.
Ainda de acordo com a OMS, nas américas, cerca de 50 milhões de pessoas viviam com depressão em último levantamento, o que equivale a cerca de 5% da população. ao site da Organização Pan-Americana da Saúde, a diretora do órgão Carissa Etienne relata que no âmbito geral "a depressão afeta a todos nós. Não discrimina por idade, raça ou história pessoal. Isso pode prejudicar os relacionamentos, interferir na capacidade das pessoas e diminuir seu senso de autoestima".
O psiquiatra e professor Amaury Cantilino reforça que, “independentemente de chegar num quadro depressivo, os sentimentos todos nós temos e o importante é que se coloque na cabeça dessas mulheres que estão gerando um filho que a partir de agora todos os seus sentimentos vão ser multiplicados por dois e tudo vai ter um impacto afetivo muito maior, e não é porque a pessoa quer, é porque a natureza fez assim”.
Tratamento
É de suma importância que as grávidas que estejam com depressão procurem atendimento psiquiátrico e/ou psicológico. Só esses profissionais é que conseguirão perceber o nível de depressão que a grávida está passando.
Rosilda trabalhou por muitos anos no Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP), localizado na capital pernambucana / Foto Rafael Bandeira
A psicóloga Rosilda Linhares aponta que o seu trabalho em consonância com o psiquiatra é essencial para que ambos consigam melhorar a situação da gestante acometida pela depressão. “Existem três tipos de depressão: a simples, a moderada e a grave. Quando avaliamos a paciente, começamos a definir como será o tratamento e a analisar como ela está respondendo a todo o processo”, diz Rosilda.
A psicóloga garante que a melhor coisa a se fazer com a mulher que está sofrendo com a depressão é “maternar, dar colo, ouvir e mostrar sempre um lado positivo da gravidez. Sempre dando estímulos para que ela saia do negativo e comece a enxergar as coisas boas pelo qual está passando”.
Rosilda acentua que esse tratamento para a mente da grávida é ideal. “A nossa mente é como uma esponja. Se digo que estou ruim, vou ficar ruim. Mas quando começo a observar minha barriga, a me olhar no espelho sempre positivamente, isso será bom para a minha mente”.