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Lobão esteve no Recife, na noite desta terça (3), para o lançamento do quarto livro de sua carreira, Guia politicamente incorreto dos anos 80 pelo Rock. Antes de receber os leitores para uma sessão de autógrafos, o artista falou ao LeiaJá sobre como foi escrever sobre a época que "detestou" viver mas que, para ele, foi a "última epopeia musical brasileira". Lobão também comentou sobre como enxerga a cultura brasileira como um "metiê" do "coronéis" da MPB, como Caetano Veloso, Gilberto Gil e Choco Buarque, entre outros, desde os anos 1980 até hoje, passando por um Chico Science "filiado" a esse circuito. Ele também confirmou que se orgulha de ser um 'fora da curva' da música brasileira e que somente a partir do próximo disco, Antologia Politicamente Incorreta Dos Anos 80 Pelo Rock, é que pode ser chamado de cantor. Confira.

O que o leitor vai encontrar no livro?

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Os anos 1980. Como eles nasceram, como cresceram e como morreu. A rapidez com que ele apareceu e a proficuidade com que foram geradas canções, que até eu mesmo me assustei com a quantidade de canções lindas, dentro de uma precariedade extrema, tecnológica, cultural, o coronelato da MPB todo contra, o fenômeno de contribuir com o cancioneiro da música popular brasileira com o rock, que é uma coisa americanizada, que sempre houve tanto preconceito contra. Então, é uma epopéia, praticamente. Eu acho que os anos 1980 foram a última epopeia musical brasileira.

Você traz muito esse momento da MPB sendo subvertida pelo rock. Você acha que o rock tem uma importância maior que os outros estilos?

Eu acho que o rock tinha, contra ele e a favor dele ao mesmo tempo, o fato dele ter sido negligenciado, ninguém pensava que o rock poderia ter uma música de sucesso no quarteirão da minha tia, quanto mais ser o gênero hegemônico daquela época. Isso foi de encontro ao que estava fora da esfera do poder. Eles até tentaram, lançaram bandas como Cor do Som, 14 Bis, coisas que eram da tutela desses caras, mas quem dominou mesmo culturalmente foi o grupo independente dessa tutela. E não porque o rock era mais forte, mas porque ele estava fora do escopo do controle desses coronéis.

Você acha que a música brasileira piorou desde aquela época?

A música brasileira piorou muito só que, o que acho interessante é você ver, pela maneira que eu relato, a hegemonia desse grupo de coronéis que até então produziu coisas muito boas e a volta dos anos 1990 com muito mais política do que artística desses caras já dominando tudo, porque eles dominavam o axé, o sertanejo, o pagode e até mesmo os grupos de rock. Você vê por exemplo, o Chico Science ele veio beijando a mão do Gilberto Gil, cantando Maracatu Atômico, já filiado. Então os anos 1990 já vêm com todo mundo filiado, mesmo o rock, então já não é mais nada de mais.

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Você acha que o pessoal da década de 1980 envelheceu bem?

Eu sempre fui um outsider dos anos 1980, meus amigos morreram muito antes de eu me enturmar com qualquer um deles. Eu fui dos sócio-fundadores, mas eu não concordo com praticamente nenhum deles, eu só reconheci, durante esse livro, o talento de muitos daqueles que eu nunca tinha reconhecido, que era puro preconceito meu. Mas eu não tenho contato com quase nenhum deles. Eu tinha um contato maior com o Cazuza, com o Evandro, que foi meu companheiro de banda, o Roger, nós fizemos uma parceria no começo desse ano. Mas, sinceramente, envelhecer, eu não sei. Eu acho que os anos 1980 pagaram um preço muito caro, mas ao mesmo tempo muito exato, pela covardia de muitos, pelo silêncio de quase todos e pela credulidade de todos em relação a determinadas figuras que eu sempre falei que não eram da menor confiança. Como eu falava para o Cazuza: 'você já é um homem feito, você não é mais uma tiete pra ficar bajulando Caetano, esses caras não são seus amigos'. Esses caras (da MPB) acham que pra ser músico brasileiro tem que ter componentes étnicos, um pandeiro, a prosódia, as influências subjetivas não contam pra essas pessoas contanto que se você tiver o beneplácito deles e uma forma de se submeter à autoridade deles você passa desapercebido. Você conviver com esses fatos gritando na sua cara é uma coisa muito assustadora de como a cultura brasileira se coloca diante desses caras. Eu nunca me coloquei. Acho que é por isso que eu tenho autoridade pra falar. Eu até gosto, conheço o trabalho deles a ponto de admirá-los. Ok. Mas nenhum deles é um gênio, muito menos um deus. São compositores, têm seu talento, mas ter esse poder todo é uma coisa que só um metiê muito subserviente pra poder se submeter a isso. E eu avisei que isso ia acontecer. A Marisa Monte é o símbolo do corvo da destruição. Ela toda vestida de luxo, a MPB tratada como artigo de luxo e nós carregando toda essa indústria com discos de baixíssimo orçamento. Levando toda a economia adiante só que não recebendo as benesses desse desenvolvimento. e também por bundamolice das pessoas, inocência nossa, ninguém sabia como lidar com um sucesso tão repentino.

Você se diz um "outsider", esse é de fato o seu lugar na música brasileira, 'fora da curva'?

É, com toda certeza. Nunca me enturmei, não tenho porque me enturmar, e estou muito confortável assim. Eu tenho a minha força, me nutro da minha própria força, meu habitat é o campo de batalha. Me sinto muito confortável com qualquer tipo de desafio, quanto mais tosqueira, mais eu cresço, quanto mais desafios mais eu me reinvento. Eu sou assim.

Depois do livro vem um disco duplo, Antologia Politicamente Incorreta Dos Anos 80 Pelo Rock. Deve ter sido difícil fazer esse repertório...

Já foi difícil escrever o livro, foi um sofrimento enorme. Foi uma época que eu detestei viver, foram meus piores discos. Eu nem era um artista, eu era um acidente. Mas, fazer o disco me emocionou muito porque eu tive que tratar como se fossem minhas músicas de arqui-inimigos de outrora. Imagina eu cantar Paralamas do Sucesso, ou a emoção quando eu gravei O tempo não para, ou as músicas dos punks, Inocentes, Plebe Rude. Foi uma aventura épica, ainda mais nas condições que a gente gravou. O desafio de em 28 dias produzir 25 músicas, isso é quase que inaceitável. Mas a gente conseguiu.

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Você não gosta de ser chamado de cantor. Por quê?

Porque eu sou baterista desde os três anos de idade. Eu lembro quando a gente fazia banda na rua, a gente escolhia assim os mais bem dotado seriam os instrumentistas, o cara que não fazia p*** nenhuma ia ser o cantor. Então quando me chamam de cantor eu até fico meio ofendido. Apesar de na cultura mainstream o cantor ser o cara. Mas, eu também não me acho cantor, eu estudei bateria, violão e nunca estudei canto. Então não me considero porque nunca fiz por onde ser um cantor. Mas esse meu próximo disco é uma experiência como intérprete, eu nunca interpretei nada que não fosse meu, então, a partir de agora, pode me chamar de cantor, realmente.  

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